29 março 2009

Não é mentira!

No próximo dia 1° de abril completa-se 45 anos do Golpe Militar. Tal “aniversário” me lembrou que há cerca de 4 meses escrevi uma matéria para a faculdade abordando o tema. Naquela ocasião tive a oportunidade de entrevistar pessoas que vivenciaram os anos ditatoriais, e principalmente, que foram presas sob a acusação de ser “simpáticas ao comunismo”. Tenho pelos “anos de chumbo” um verdadeiro fascínio. Aliás, há muitos anos me interesso pelo período militar brasileiro e latino-americano (com hífen ou sem?) por considerá-lo um momento histórico-cultural impar. Pude durante esses anos entre o ensino médio e a faculdade assistir, ler e ouvir inúmeros depoimentos e relatos de perseguidos políticos e artistas, todos me impressionaram deveras, mas era algo como que distante, surreal...


No entanto ao conversar pessoalmente com torturados o impacto é muito maior. Incomensuravelmente maior, afirmo mesmo ciente da hipérbole cometida. Dessa maneira, o asco pelos militares golpistas e seus apoiadores civis se torna “concreto”, o que antes era esboço fixa-se como desenho definitivo. Bom, eu poderia ter escrito um texto jornalístico para lembrá-los sobre o Golpe, ter falado sobre o escandaloso e equivocado editorial da Folha de São Paulo que ousou “nomenclaturar” tão tenebrosa época com o eufêmico “Ditabranda”. (O que denuncia, é claro, as intenções dos grandes veículos de comunicação de promover o esquecimento e fomentar a amnésia da população). Mas prefiro em casos como este oferecer a minha interpretação subjetiva, talvez seja mais humana que a pretensa imparcialidade dos fatos.


Para encerrar um poema de Brecht:


Primeiro levaram os comunistas

Mas não me importei com isso

Eu não sou comunista.

Em seguida levaram alguns operários

Mas não me importei com isso

Eu também não era operário.

Depois prenderam os sindicalistas

Mas não me importei com isso

Também não sou sindicalista.

Depois agarraram os sacerdotes

Mas como não sou religioso

Também não me importei.

Agora estão me levando,

Mas já é tarde.



PS: Volto no Dia da Mentira pra postar algum clássico da MPB que denunciava a "carinhosa" Ditadura.

28 março 2009

Em três tempos

Estou sem condições psicológicas(?) para escrever algo decente. Decente. O que seria algo decente? Acho que deveria me preocupar mais com "a fome na África, e não com coisinhas" como bem disse um grande amigo enquanto fazíamos testes de psicologia cognitiva em um bar nessa madrugada. Mas por que só me preocupar com a fome naquele continente se aqui tão perto há situações semelhantes? Não sei... Aliás, no momento só existe uma preocupação, nenhuma esperança e três tempos:


Passado:

Como Poe, poeta louco americano,
Eu pergunto ao passarinho: "Blackbird, o que se faz?"
Raven never raven never raven
Blackbird me responde
Tudo já ficou atrás
Raven never raven never raven
Assum-preto me responde
O passado nunca mais

(Velha Roupa Colorida, Belchior)

Presente:

Um dia, não haverá mais estrelas
sem olhos no meio da noite turva

Das borras de café surgirão sombras
capazes de esculpir a ausência dos corpos

Flores brotarão das toalhas das mesas,
das tristes mesas das casas sem mãe

E a poesia escreverá seus poetas,
a mostrar-lhes que a morte é comida caseira,
feita de agoras

(Da Morte, Beatriz Sayad)

Futuro:

Que a força do medo que eu tenho,
não me impeça de ver o que anseio.

Que a morte de tudo o que acredito
não me tape os ouvidos e a boca.

Porque metade de mim é o que eu grito,
mas a outra metade é silêncio...

Que a música que eu ouço ao longe,
seja linda, ainda que triste...

(Metade, Ferreira Gullar)

26 março 2009

24 março 2009

"Assassinos da filosofia"

Reproduzo abaixo a opinião de Deleuze sobre Wittgenstein concedida a jornalista Claire Parnet em decorrência da gravação do "Abecedário de Gilles Deleuze". Deleuze é um dos grandes nomes do pensamento complexo francês da segunda metade do séc. XX, aliás não se pode pensar a psicanálise, ou mesmo a internet, comtemporânea sem cometer a gafe de não recorrer aos intricados conceitos criados por ele e Guattari, por exemplo. Reitero: aqui está, mais especificamente, o verbete W do Abecedário. Entretanto, recomendo aos interessados a leitura dos demais, eles revelam o quão aguçado pode ser o pensamento mesmo em questões aparentemente pouco relevantes.

Ah, acho também que as palavras do "rizomático" filósofo (radicais, duras, inapropriadas talvez) podem ser aplicadas a uma série de outros pensadores, ou melhor ao séquito de ignorantes que apreendem qualquer teoria filosófica como dogma. Começo a gostar dos peirceanos...


Claire Parnet: Vamos ao W.

Gilles Deleuze: Não tem nada em W.

Claire Parnet: Tem sim: Wittgenstein. Sei que não é nada para você...

Giles Deleuze: Não quero falar disso. Para mim, é uma catástrofe filosófica. É uma regressão em massa de toda a filosofia. O caso Wittgenstein é muito triste. Eles criaram um sistema de terror, no qual, sob o pretexto de fazer alguma coisa nova, instauraram a pobreza em toda a sua grandeza. Não há palavras para descrever este perigo. E é um perigo que volta. É grave, pois os wittgensteinianos são maus, eles quebram tudo! Se eles vencerem, haverá um assassinato da filosofia. São assassinos da filosofia.

Claire Parnet: É grave, então?

Gilles Deleuze: Sim, é preciso ter muito cuidado!